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Entrevista: Relações entre convívio escolar e saúde emocional

24 de julho de 2023

Ao olhar para o sofrimento psíquico manifestado por alunos e alunas da Rede Municipal de Ensino de São Paulo, o projeto Respeitar é Preciso! tem destacado a produção social desse sofrimento, relacionada a questões como machismo, racismo, capacitismo, LGBTfobia. É o que explica Ane Talita Rocha, supervisora de Educação Básica da área de Educação em Direitos Humanos do Instituto Vladimir Herzog. 

Segundo Rocha, as dimensões sociais do sofrimento se reproduzem na escola e, por isso, é importante um olhar atento de educadores/as para o cotidiano escolar. Afinal, este é um espaço privilegiado para aprendizados sobre o reconhecimento de si e do outro como sujeito de direito.

O projeto Respeitar é Preciso! atua na Rede Municipal de Ensino de São Paulo pela parceria entre Instituto Vladimir Herzog e Secretaria Municipal de Educação. O projeto tem desenvolvido a ação piloto “Acolhimento e Saúde Emocional na Perspectiva da Educação em Direitos Humanos”, além de ter realizado em 2023 o 4º Grande Encontro das Comissões de Mediação de Conflitos com o tema “Educação em Direitos Humanos e promoção da saúde emocional na escola”.

Leia a seguir a conversa com Ane Talita Rocha, que atua no projeto.


Diferente dos serviços de Saúde, que oferecem tratamentos individuais, a Educação é espaço do coletivo. Como pensar no sofrimento emocional com essa perspectiva? 

Ane Talita Rocha – O Respeitar é Preciso! tem olhado muito para a questão do sofrimento dos alunos e alunas da Rede Municipal de Ensino e tem sido muito importante olhar para a dimensão social desse sofrimento. Sem desconsiderar características individuais de cada uma dessas pessoas, mas entender que na nossa sociedade há condições coletivas e que causam sofrimento, como, por exemplo, é o caso do racismo, do machismo, da misoginia, do capacitismo… Então, precisamos levar todas essas dimensões em conta nas vivências dos indivíduos e entender essa estrutura social que há por trás do sofrimento. 

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Como a produção social do sofrimento se reproduz na escola? É possível evitar que isso aconteça?

Ane Talita Rocha – A escola não é uma bolha no meio da sociedade, então é claro que todas as questões sociais atravessam a escola e acontecem dentro dela também. Por isso, é muito importante que a gente esteja atentos e atentas, enquanto educadores e educadoras, para essas questões, que a gente chama de marcadores sociais da diferença. Não podemos tratar o aluno ou a aluna como um ser abstrato, sem levar em consideração que tem uma cor de pele, orientação sexual, gênero…. Especificidades que podem tornar as pessoas mais ou menos suscetíveis e vulneráveis a violências na sociedade e dentro da escola.

Além da transmissão de conhecimentos, é função da escola fazer com que crianças e adolescentes aprendam a viver em sociedade. Para esta dimensão se realizar, é muito importante fortalecer instâncias de participação e propiciar a formação de sujeitos de direito. A ideia de “sujeito de direito” é essencial para o projeto Respeitar é Preciso! e para a Educação em Direitos Humanos: eu me enxergo enquanto sujeito de direito e também enxergo o outro como sujeito de direito. Essa compreensão se dá no campo da prática, no cotidiano escolar.

Então, enquanto a Saúde cuida do indivíduo, a Educação pode ter um papel importante no convívio coletivo?

Ane Talita Rocha – É claro que, em alguns casos de sofrimento, tratamentos individuais são recomendados, mas isso não é a função da escola. A função da escola é outra. É a do aprendizado para a vida coletiva.

A escola é o lugar do coletivo em si. É ali onde a gente aprende a viver em sociedade, onde temos a possibilidade de conviver com as diferenças, encontrar pessoas diferentes de nós, com pensamentos diferentes ao nosso e da nossa família. Não é um lugar de tratamentos individuais, mas é um espaço muito importante para esses aprendizados da vida coletiva.

Assim, é na escola que podemos propiciar que alunos entendam e, principalmente, vivenciem esses aprendizados de valores como igualdade, equidade, justiça, por meio de escuta, respeito, diálogo. Não é apenas no discurso, de falar sobre não violência, mas sim no campo da prática.

Entrevista por Natália Pesciotta

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