Fê Lopes: “Para produzir pertencimento, é preciso olhar onde a escola está inserida”
25 de julho de 2023
Fernanda Lopes Sanchez Derballe, Fê Lopes, é psicóloga e psicanalista. Ela compôs a mesa redonda “Educação em Direitos Humanos e promoção da saúde emocional na escola” durante o 4° Grande Encontro das Comissões de Mediação de Conflitos. O evento integrador faz parte do projeto Respeitar é Preciso!, realizado pela parceria entre o Instituto Vladimir Herzog e a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, e aconteceu no dia 23 de maio de 2023, no Sesc Pinheiros.
Antes de sua participação na mesa, Fê Lopes conversou com o Portal Respeitar é Preciso! sobre desafios e possibilidades para a produção do pertencimento no ambiente escolar, tendo em vista a importância disso para a saúde emocional de toda a comunidade escolar.
“O que eu considero importante pra gente criar relações de pertencimento no ambiente escolar é que a gente realmente esteja aberto para o diálogo”, ela afirma.
Leia mais na entrevista abaixo.
Respeitar! – Sabemos que a sociedade produz sofrimento de várias maneiras. É possível que o ambiente escolar não reproduza essas mesmas lógicas?
Fê Lopes – É impossível que o ambiente escolar não reproduza os sofrimentos que acontecem na sociedade, porque a escola não é um satélite separado da sociedade. Ela tá aqui dentro, então ela vai reproduzir, em alguma medida, o que acontece lá fora – não só o sofrimento, as violências, mas tudo.
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Respeitar! – Na sua visão, quais são essas questões produtoras de sofrimento na sociedade e que aparecem no ambiente escolar?
Fê Lopes – A gente tem os problemas particulares, relacionados com a sua história pessoal, com os problemas que estão acontecendo na sua casa, com a sua família, que vão aparecer lá no ambiente escolar. Mas a gente também tem os problemas macros, estruturais. Então o racismo, o sexismo, a misoginia, a LGBTfobia, gordofobia, todas as questões que a sociedade como um todo está enfrentando vão atravessar a escola e vão ser produtoras de sofrimento.
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Respeitar! – Qual é a relação entre promoção da saúde emocional no ambiente escolar e produção de pertencimento?
Fê Lopes – Produzir pertencimento na escola é o desafio que a gente tem nesse momento. Porque a escola, ela precisa ser um lugar que tanto os professores, os diretores, os alunos, as famílias entendam que é um lugar pra ir e que é “o meu lugar no mundo”.
Enquanto criança, adolescente, aquele é meu lugar no mundo. Um lugar onde estão as minhas pessoas, é o meu ambiente. Só que, para isso, eu também preciso que a escola, os educadores, os diretores, entendam que eu faço parte desse lugar. Ou seja, não dá para eu produzir pertencimento sem pensar que o pertencimento vai ser criado no “com” e não no “para”. Não numa direção colonizadora, dominadora.
Eu preciso olhar para onde essa escola está inserida. Quais são as coisas que essas crianças, esses adolescentes já têm de referência? Como é que eu construo educação e transmito conhecimento do que eu já tenho e integro com as referências que eles têm? Esse é um grande desafio para criar pertencimento. Porque a gente quer criar o pertencimento, mas a gente quer de cima para baixo, a gente não quer fazer numa horizontalidade.
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Respeitar! – O que considera importante para que relações de coletividade e pertencimento aconteçam na escola?
Fê Lopes – O que eu considero importante pra gente criar relações de pertencimento no ambiente escolar é que a gente realmente esteja aberto para o diálogo. Um diálogo em que eu de fato esteja disposto a escutar o outro, não de uma maneira normativa, por obrigação. Mas que eu tenha uma curiosidade sobre o outro. Ouvir porque eu quero te conhecer, eu quero saber quais são as suas referências – eu não tenho medo delas. Aí, quando eu abro esse espaço de diálogo, o outro traz coisas, eu trago coisas e a gente vai criar uma terceira coisa.