54469592259_7d367b650c_c

Paula Fonseca: Escola, o lugar em que a gente pode pensar acompanhado

Em ação formativa do projeto Respeitar é Preciso!, a psicóloga e pesquisadora destacou a convivência respeitosa como parte do processo de aprendizagem no espaço escolar

.

Sem convivência, não há aprendizado. E a convivência também é algo que se aprende, lembra a psicóloga e doutora em Educação Paula Fontana Fonseca em entrevista ao Portal Respeitar é Preciso!. A especialista foi responsável pela aula inaugural da formação “Educação em Direitos Humanos: Interfaces entre educação e sociedade”, oferecida pelo projeto Respeitar é Preciso! – uma parceria entre Instituto Vladimir Herzog e Secretaria Municipal de São Paulo – a educadores/as da Rede Municipal de São Paulo.

“A construção do respeito é algo que se ensina e se aprende na relação com os outros, na relação com o conhecimento”, afirma Fonseca. Para contribuir com esse desafio e oportunidade diária no ambiente escolar, a formação convida educadores/as a refletir sobre questões contemporâneas que se encontram nas relações cotidianas.

A aula inaugural “Convivência e aprendizagem na perspectiva da Educação em Direitos Humanos”, ministrada por Paula Fonseca, aconteceu presencialmente em abril de 2025, e é seguida por cinco aulas online assíncronas, com diferentes especialistas e temáticas, como racismo ambiental, saúde emocional, marcadores sociais da diferença, entre outras. O curso compõe uma das formações do projeto Respeitar é Preciso! na Rede Municipal, que há 10 anos contribui com a promoção de ambientes de respeito e aprendizagem.

Para Fonseca, também a educadores/as é essencial haver espaços como estes de troca para se construir conhecimentos coletivamente. “Toda aprendizagem se dá quando a gente se abre para conhecer alguma coisa que, sozinha, não tem condição de conhecer”, resume.

> Clique aqui para ver as fotos da aula inaugural “Convivência e aprendizagem na perspectiva da Educação em Direitos Humanos”, com Paula Fonseca


Leia a entrevista completa:

Respeitar é Preciso! – Como a construção do respeito e do bom convívio escolar se relaciona com o processo de aprendizagem?

Paula Fonseca – A convivência é algo que a gente aprende. E é algo essencial para o que a gente construiu como humanidade, que é estar no mundo com os outros. 

Essa é uma das ideias que eu levei para a aula inaugural através de uma citação de Valter Hugo Mãe: a ideia de que a minha humanidade não começa em mim, ela começa no outro. Isso já coloca a gente, de princípio, atrelado a uma experiência de alteridade: Construo uma experiência própria a partir do que vivo com o outro. Então, a convivência, a experiência com o outro, ela é fundante daquilo que é o humano. Por isso que ela também é tão complicada e preciosa. 

Toda aprendizagem se dá quando a gente se coloca em relação a um legado que veio antes. Quando, de alguma forma, a gente pode se abrir para conhecer alguma coisa que, sozinha, não tem condição de conhecer.

“Toda aprendizagem se dá quando a gente se abre para conhecer alguma coisa que, sozinha, não tem condição de conhecer.”

Respeitar é Preciso! – Construir um ambiente de respeito na escola é essencial inclusive para a aprendizagem acontecer. Como os educadores podem fazê-lo?

Paula Fonseca – A construção de respeito na escola passa muito por aprender a lidar com os atritos e conflitos que surgem. Após a pandemia, quando algumas atividades escolares presenciais estavam sendo retomadas, conversei com educadoras da educação infantil e sempre diziam que as crianças pequenas não sabiam mais circular nos espaços abertos da escola sem esbarrar umas nas outras. 

Esse fenômeno foi uma das consequências provocadas pela retirada do espaço coletivo em que as crianças interagem desde pequenas. Essas trombadas são uma forma de contato com o outro. É a forma de contato mais desejada? Não. Mas é uma forma de perceber o meu efeito no outro e os efeitos que o outro provoca em mim, porque eventualmente isso pode machucar. Mas pode também virar uma brincadeira onde as crianças esbarram sutilmente umas nas outras. 

Experimentar o conflito e consequentemente aprender sobre os limites são uma das muitas maneiras de se construir respeito. Os limites constroem referências a partir das quais uma vida coletiva é possível. É na escola que as crianças podem aprender isso de forma segura e mediada. 

A construção do respeito é algo que se ensina e se aprende na relação com os outros, na relação com o conhecimento. É um processo essencial da experiência humana que é muito bem desenvolvido dentro das escolas.

“Experimentar o conflito e aprender sobre os limites são uma das muitas maneiras de se construir respeito e referências de uma vida coletiva possível. É na escola que as crianças podem aprender isso de forma segura e mediada.”

Respeitar é Preciso! – Considerando que os conflitos são inerentes à convivência humana, qual é a importância do papel que as Comissões de Mediação de Conflitos desempenham nas escolas da Rede Municipal de São Paulo? 

Paula Fonseca – Acho que as CMCs são fundamentais! A escola é uma instituição e as instituições precisam pensar sobre os processos que elas desenvolvem internamente. Para que o conflito possa ser experimentado como parte da experiência de construção de conhecimento, a escola tem que conseguir tomar o conflito como algo a ser cuidado também.

“Para que o conflito possa ser experimentado como parte da experiência de construção de conhecimento, a escola tem que conseguir tomar o conflito como algo a ser cuidado também”

O conflito faz parte da experiência escolar. Assim como se apaixonar pode fazer parte da experiência escolar – se apaixonar por uma pessoa, por um conhecimento, por um autor… Muitas paixões podem acontecer dentro de uma escola. Mas não é porque eu me apaixonei por uma área do conhecimento que eu vou perder as outras de vista, certo?

Então, a escola está o tempo inteiro buscando mediar essas vivências mais intensas, garantindo um equilíbrio. A mediação de conflito vai lidar exatamente com as situações em que um indivíduo ultrapassou os limites estabelecidos como necessários para a convivência escolar. É preciso que a escola tenha um espaço para restabelecer esses limites. Toda instituição precisa ter espaços que avaliem e preservem os próprios princípios. Na escola, as CMCs são uma das principais ferramentas para isso.

Respeitar é Preciso! – Qual é a importância de ações formativas como esta que você participou, reunindo educadores e educadoras da rede pública para pensar em convivência e aprendizagem?

Paula Fonseca – A escola é esse lugar onde a gente pode pensar acompanhado. Acompanhado de outros colegas, de pessoas que estão em posição diferente em relação à nossa, como o professor, o diretor, os funcionários. Podemos pensar em conjunto aos outros seres, que possuem outras vivências.

A escola traz a possibilidade de me deslocar daquilo que me situa aqui agora, certo? Ações formativas como essa “Educação em Direitos Humanos: Interfaces entre educação e sociedade” são um convite aos professores, para que também possam pensar acompanhados. 

Eu levei algumas referências para que pudéssemos conversar a partir delas. Essa é uma das formas de arejar e revisitar as práticas pedagógicas. Deste modo, os educadores podem refletir sobre conceitos, princípios e os efeitos que eles provocam nos alunos.

Confira mais fotos sobre o evento por meio deste link: https://flic.kr/s/aHBqjCafWK.

Deixe um Comentário