Autor da Experiência
Elaine Gobbe e Márcia Osti
Cargo
Gestão Escolar
Escola
CEI Quinta do Sol
Cidade
São Paulo
9 de janeiro de 2025
Com ações permanentes, CEI Quinta do Sol valoriza a diversidade de identidades de bebês, crianças e suas famílias; Essa foi uma das experiências compartilhadas nos Seminários Regionais das Comissões de Mediação de Conflitos
O CEI Quinta do Sol, localizado na Zona Leste da cidade de São Paulo, desenvolve múltiplas ações de caráter contínuo e permanentes com o objetivo de criar um ambiente coletivo que valoriza as múltiplas culturas de origem dos alunos da unidade. O projeto Quintal de Todos começou quando as educadoras Elaine Gobbe e Márcia Osti perceberam a exclusão que alunos e famílias imigrantes sofriam na comunidade escolar.
Segundo relato que elas compartilharam com colegas de outras unidades durante a 5ª edição dos Seminários Regionais das Comissões de Mediação de Conflitos, hoje elas percebem uma maior diversidade de cores, aromas, repertórios, livros e imagens no cotidiano do CEI, além de notarem o aumento da participação de toda a comunidade nas atividades, o fortalecimento de vínculos e melhorias nos processos de aprendizagem.
Sensibilizadas por uma formação sobre povos imigrantes oferecida pela DRE Penha, Elaine e Márcia começaram a repensar a forma como se relacionavam com as famílias imigrantes que compunham a comunidade escolar. As educadoras procuraram compreender quais as principais dificuldades que essas pessoas enfrentam ao tentar se estabelecer no Brasil e de quais formas elas poderiam proporcionar um ambiente educativo de acolhimento e segurança para essas famílias.
As educadoras então passaram a elaborar atividades pedagógicas em sala de aula que trabalhassem, de forma visual e compatíveis para a faixa etária, a valorização das culturas latino-americanas. Em especial as culturas bolivianas, venezuelanas e equatorianas, local de origem de 20 alunos da unidade.
Além disso, Elaine e Márcia procuraram entender quais as melhores formas de estabelecer um diálogo efetivo e acolhedor com os responsáveis que não possuem o português como primeira língua. Como parte da solução para os problemas de comunicação, elas começaram a adaptar avisos, posters e anotações da agenda para o espanhol com a ajuda de tradutores online.
Com o tempo, outras/os profissionais da educação passaram a entender o trabalho de educação em direitos humanos desenvolvido pelas duas educadoras e passaram a estudar e planejar mais estratégias pedagógicas com base na EDH para a educação infantil.
As atividades
O trabalho desenvolvido nas salas de aula foi pensado para se adequar às necessidades das crianças muito pequenas, em idade pré-escolar: “Enquanto professoras, nós trabalhamos muito com imagens porque o projeto surgiu no momento em estávamos trabalhando no berçário. Crianças nesta faixa etária precisam muito daquilo que é visual para poder entender e se apropriar do conhecimento. Também adotamos vídeos com músicas bolivianas infantis em espanhol”, lembra Márcia.
Este tipo de estratégia pedagógica é uma das mais indicadas no trabalho da educação em direitos humanos durante os períodos pré-escolares. De acordo com o Caderno EDH para Todas as Idades, que faz parte do material pedagógico do REP!, “É possível fazer um levantamento das canções infantis cantadas pelas famílias da comunidade e mantê-las no repertório das crianças. Essa é uma forma de reafirmar o pertencimento a uma cultura, direito de todos, e dizer às crianças que os saberes das suas famílias são considerados e apreciados na escola, o que colabora com a construção da autoimagem positiva, essencial para que se constituam como sujeitos de direito”.
Com o tempo os educadores foram percebendo que outras demandas precisavam ser incluídas no processo de aprendizado das crianças, como a educação antirracista. Músicas de inúmeros contextos culturais foram ensinadas em sala de aula para que as crianças compreendessem o papel das culturas afrobrasileiras, indígenas e nordestina na formação da sociedade brasileira.
Para combater a discriminação que as crianças negras enfrentavam por conta da textura de seus cabelos crespos, as/os educadores/as criaram também o “Dia da Beleza”, em que todas as crianças têm seus cabelos penteados e adornados durante a aula como forma de valorizar as características físicas de cada uma. “Todas as vezes que terminávamos de pentear o cabelo das crianças elas iam automaticamente para o espelho. Era uma questão muito automática e assim eles puderam criar uma autoimagem positiva de si mesmos”, explicou Elaine. Além disso, as professoras também buscaram sensibilizar os educadores do CEI para a necessidade de combater as manifestações de racismo recreativo no ambiente escolar.
Toda a escola participa
Em 2024, Márcia e Elaine passaram a fazer parte da gestão do CEI Quinta do Sol, e ações que antes eram desenvolvidas por algumas salas de aula, puderam ser discutidas por toda a comunidade escolar. A proposta de uma educação antirracista e antixenofóbia agora faz parte do PPP do CEI Quinta do Sol. A escolha dos educadores por incluir essas perspectivas no PPP está alinhada à Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil de 2009, que estabelece que “Desde muito pequenas, as crianças devem ser mediadas na construção de uma visão de mundo e de conhecimentos plurais, formar atitudes de solidariedade e aprender a identificar e combater preconceitos que incidem sobre as diferentes formas de os seres humanos se constituírem como pessoas”.
Além das atividades trabalhadas em sala de aula com as crianças, o CEI realiza grandes atividades integrativas com toda a comunidade escolar. Uma delas consiste em um encontro mensal cujo tema está relacionado diretamente com a cultura de origem de um dos alunos da escola.
O encontro teve como temas a cultura boliviana, indígena Fulni-ô e nordestina. Para o encontro, a equipe que opera na cozinha escolar prepara um prato típico da cultura que será abordada no dia para o almoço ou jantar. Crianças e educadores elaboram atividades e decoram os corredores da escola tendo a cultura em questão como referência.
“A questão da alimentação é importante porque traz memória afetiva. Recepcionar alguém com um prato da sua região é muito bom e aconchegante. As crianças reconhecem a comida e essa é uma forma de dizer ‘Olha, aqui também é o seu lugar’”, disse a educadora Elaine.
Em todos os encontros, crianças e adultos são incentivados a vestir as roupas tradicionais de seus locais de origem. Essa é uma forma das crianças apreciarem as diferenças entre si e entenderem mais umas sobre as culturas umas das outras. Segundo Márcia, a felicidade dos alunos é contagiante: “Uma das nossas alunas veio com uma roupa venezuelana das cores da bandeira do país e desfilou por toda a escola falando ‘Olha, essa é a minha bandeira’, ela estava se sentindo muito representada. Eu me emocionei!”.
A construção de uma comunidade
O resultado do projeto Quintal de Todos é perceptível no dia a dia do CEU, que tinha dificuldades para formar laços comunitários do período de retorno ao funcionamento presencial após a pandemia. Agora, mais famílias participam das reuniões e eventos da escola. E as/os professoras/es conseguem manter um diálogo mais aberto e constante com as/os responsáveis.
Além disso, as/os educadoras/es vêm relatando uma grande melhora no comportamento e nos processos de aprendizagem das crianças. Há muitos casos de crianças antes tímidas e muito retraídas que passaram a interagir melhor com colegas de classe após serem envolvidas nas ações do projeto: “As crianças aprendem melhor quando se sentem amadas e acolhidas pelos adultos de referência. O projeto veio para reforçar isso”.
Além do CEI
Durante a 5ª Edição dos Seminários Regionais das Comissões de Mediação de Conflitos, realizado pelo projeto Respeitar é Preciso! em setembro de 2024, Elaine e Márcia apresentaram as atividades desenvolvidas por elas para 50 outros educadores da rede pública municipal de São Paulo. Lá, educadoras/es de toda a região puderam aprender mais sobre a experiência desenvolvida no CEI Quinta do Sol, e observar como a implementação de práticas cotidianas alinhadas à educação em direitos humanos contribuiu para o fortalecimento da convivência democrática.
Através da análise da experiência vivenciada no CEI, todos os participantes puderam entender de forma mais concreta as possibilidade que a educação em direitos humanos na educação infantil oferece para a garantia de direitos dos bebês e crianças na primeira infância. O grupo também trabalhou e elaborou formas de mediar os conflitos que ocorrem entre os diferentes grupos e comunidades que frequentam os centros de educação infantil.
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Em evento com especialistas, Respeitar é Preciso! abordará questões da convivência escolar